Qual a diferença entre o frango e os ovos orgânicos, caipiras, naturais e convencionais? Para descobrir, em 2011 fui ao interior conhecer de perto as granjas alternativas.
Há muitos anos consumo ovos e frango de produtores comprometidos com o bem-estar animal e práticas agropecuárias amigáveis para o meio ambiente. Estou falando de marcas como Yamaguishi, Fazenda da Toca, Korin e Epicentro Dalva. Sou reduceriana (consumo alimentos de origem animal em pouca quantidade) e, embora os produtos sejam mais caros, tomei essa atitude sensibilizada pelos alertas que ecologistas e protetores de animais fazem sobre a realidade nada bonita das granjas modernas, que se tornaram fábricas de proteína movidas por uma engrenagem chamada galinha. Para quem se interessa pelo assunto, o documentário Food,Inc e o livro “Comer Carne”, de Jonathan Safran Foer, mostram como é a produção convencional de ovos e frango. A ONG Peta (People for The Ethical Treatment of Animals) oferece informações valiosas: http://www.peta.org/issues/animals-used-for-food/chicken-industry.aspx.
Um trailer muito resumido da situação: as aves vivem em galpões apinhados (cerca de 14 por metro quadrado) ou, pior ainda, espremidas em gaiolas, sem jamais conhecer a vida ao ar livre. Seus bicos são cortados para que não se matem reciprocamente. Antibióticos e substâncias químicas que aceleram o crescimento são adicionados à ração e à água, trazendo a perspectiva sinistra de forçar a seleção de bactérias super-resistentes. Para estimular a produção de ovos, a luz fica permanentemente acesa. Com cerca de seis semanas, são abatidas. Enfim, as galinhas comuns parecem viver em esquemas cruéis de prisão perpétua.
Mas será que as granjas alternativas são realmente diferentes?
Para descobrir isso, resolvi fazer um Galinha-Tur, que começou em Ipeúna, perto de Rio Claro, sede do setor agropecuário da Korin. Fui muito bem recebida na empresa, conversei bastante com a gerente de qualidade Cecilia Ifuki Mendes, pude visitar as instalações e até experimentar o almoço orgânico no refeitório da firma.
O esquema lá é o seguinte: a Korin compra e distribui pintinhos com um dia de vida para cerca de 20 produtores integrados (sitiantes da região), que os criam dentro de galpões. A empresa também fornece uma ração fabricada em suas dependências e mantém veterinários e zootecnistas percorrendo incessantemente as granjas para verificar se as aves estão sendo tratadas de acordo com as diretrizes da AVAL (Associação de Avicultura Alternativa). Com mais ou menos a mesma idade do frango convencional, vão para o abatedouro da Korin, onde não pude entrar porque no dia da minha visita um grupo de rabinos estava matando as aves de acordo com os preceitos kosher.
Já as poedeiras são criadas dentro da Korin, em galpões ventilados e não muito lotados. As galinhas ficam pelo chão e não têm dificuldade de caminhar. Elas têm casinhas para colocar os ovos, fazem “glu-glu” o tempo todo e olham curiosas para quem aparece. A luz fica ligada 15 horas por dia e infelizmente não passeiam lá fora. Entrei na fábrica de ração e a comida – uma mistura triturada de milho, soja e sais minerais — parece bem palatável, além de ser totalmente vegetariana, respeitando a característica da espécie.
Embora tenha frangos orgânicos, a maioria da produção da Korin é de “frango natural”. A diferença é que o milho e a soja da ração não são orgânicos. Outra classificação é a da “galinha caipira”, que pode ser orgânica ou não, e vive solta até ser abatida com cerca de 70 dias de vida.
Resumindo minhas impressões: as galinhas da Korin parecem viver em um colégio interno do tipo tradicional.
Saí de Ipeúna e fui direto para Saltinho, perto de Piracicaba, onde encontrei o jovem agrônomo Rogério Sakai, um dos sócios da Sabor e Cor. Com dois outros colegas de faculdade, ele abriu a empresa rural, que produz ovos e tomates requisitadíssimos por consumidores naturebas como eu e chefs de restaurantes bacanas. No momento da minha visita, eram 4 funcionários e 1.000 galinhas, mas o negócio estava em plena expansão. O galpão onde moram as galinhas tem saídas e elas podem passear quando quiserem. Cheguei no final da tarde, momento em que se recolhem. Mas dezenas ainda estavam se divertindo no matinho ao lado. Rogério me contou que galinhas são territorialistas e montam turmas, sendo que as líderes ficam na posição mais alta do poleiro ou dos “predinhos de apartamento” onde colocam os ovos. Cada grupo usa exclusivamente uma das entradas e ocupa uma região específica do galpão, num esquema parecido com o das torcidas de futebol. Entramos. Elas se aproximaram e começaram a dar bicadinhas nos nossos sapatos. Muito fofas! A Sabor e Cor tem uma minifábrica de ração e utiliza soja e milho orgânicos de Foz do Iguaçu (uma das poucas regiões onde ainda não há contaminação de transgênicos). Por isso os ovos são orgânicos. Sem condições de instalar um abatedouro, o start-up do campo não cria aves de corte.
Saí de lá achando que as galinhas Sabor e Cor vivem num colégio interno do tipo liberal.
O engraçado é que, poucos dias depois do passeio, minha cunhada Lucilene, sabendo desses interesses galináceo-alternativos, me presenteou com duas dúzias de ovos vindos do vizinho de sua mãe, que mora em Itapetininga. Lá as galinhas são criadas no quintal, os pintinhos ficam com suas mães e o galo está sempre por perto. Tecnologia nenhuma e muita liberdade. As galinhas comem milho e ciscam à vontade, como sempre foi antes das pessoas se concentrarem nas grandes cidades e a produção de alimentos ser transferida para empresas.
No final, fiquei achando que essas eram as galinhas mais felizes, pois vivem soltas, num pequeno grupo familiar.
Claudia, adorei. Só não sei se conseguiria acompanhá-la, pois meu coração ficaria esfrangalhado vendo os bichinhos de corte. Não consigo imaginar que qualquer situação de abate seja mais humanizada, digamos.
Por essas e outras que nós não comemos nossos semelhantes aqui em casa: nem bois, nem galinhas, nem peixes, nem perus, nem porcos. Pela saúde do nosso corpo, da nossa alma, do nosso planeta. E principalmente por compaixão.
Beijo grande, querida, parabéns pelo post!
Mesmo sendo difícil e sabendo que talvez perdesse a coragem de comer frango depois, eu gostaria de ter presenciado o abate. Essa conversa sobre o consumo de animais rende horas de papo. Não sou vegetariana, embora há mais de 20 anos não coma carne vermelha e boa parte de minhas refeições sejam vegetarianas ou totalmente veganas. Procuro consumir poquíssimos ingredientes animais e com respeito. Acho que nossa sociedade perdeu a noção e despreza a vida dos animais com tanto desperdício e esses métodos de produção cruéis. Tenho estudado bastante sobre como o abate de animais se ligava a rituais sagrados em civilizações antigas. “O Dilme do Onívoro” fala um pouco disso e Joseph Campbell em “Máscaras de Deus – volume 1” fala bastante disso. É muito bom poder trocar ideias, porque é um tema angustiante… Bjo!
As minhas galinhas de Morugaba são felizes. Tem mais espaço do que eu na minha casa, comem, dormem e brincam juntas. Os ovos são seus presentes diários. Esta semana estamos um pouco tristes. Uma foi capturada em plena luz do dia por algum bicho. Mas por outro lado é a natureza e a cadeia alimentar. Pequena escala: esse é o lema. Beijos.
Que legal! Um dia quero conhecê-las.
Claudia,
Gostei muito mas infelizmente não consegui acessar a página da Korin “http://www.korin.com.br/tecnologia/tecprod0402.asp” acredito que o link tenha sido retirado por ser um documento que complometia a forma de manejo que a Korin vende aos consuimidores e a que realmente ela pratica.
Olá Wilson,
Obrigada por avisar que o link não está funcionando. Visitei o site e foi totalmente reformulado. Deve ser por isso que a página sumiu.
Abs.,
Claudia